Quando um incêndio causado por um curto-circuito acometeu um apartamento de um edifício na Rua General Polidoro, em Botafogo, no ano passado, os funcionários do condomínio imediatamente interfonaram para todos os apartamentos a fim de evacuar os imóveis o mais rapidamente possível. Além disso, tomaram outra ação muito importante: subiram as escadas e, conhecedores das condições de todos os moradores idosos do prédio, buscaram aqueles que poderiam ter problemas para sair de seus apartamentos sem ajuda.
Esse tipo de ação só foi possível porque os porteiros haviam sido treinados para oferecer assistência diferenciada aos seus moradores idosos.
Ninguém é mais ciente desse benefício do que Rose Ferreira, advogada e proprietária da RD Longevidade, empresa especializada em pessoas idosas, cujo objetivo é oferecer soluções para organizações interessadas em empreender no Mercado Consumidor Sênior. Doutoranda em Direito e Sociologia pela Universidade Federal Fluminense (UFF), Rose tem um extenso currículo no trabalho com indivíduos em idade longeva, já tendo sido delegada da Comissão de Apoio à Terceira Idade da OAB Niterói entre 2016 e 2018, e responsável pela pesquisa “Envelhecimento Populacional, Direito do Idoso e Políticas Públicas em prol ao Envelhecimento Digno”. Recentemente, ela foi convidada a compor a Comissão do Idoso da OAB/RJ, afiliou-se à Sociedade Brasileira de Geriatria e Gerontologia, e a partir de outubro deste ano atuará como docente em uma pós-graduação em Direito e Gestão condominial pela OAB de Niterói/RJ, abordando questões importantes sobre os diretos da pessoa idosa em condomínios edilícios.
Rose começou a se concentrar nas questões que envolvem o idoso, especificamente no ambiente condominial, após analisar a pesquisa de uma seguradora, cujos dados comprovavam que muitas vezes o idoso se flagra desprovido de qualquer assistência de amigos e familiares, fato que o leva a construir fortes laços com funcionários do local onde reside, principalmente porteiros e zeladores. “Muitas vezes, o porteiro é o melhor amigo do idoso”, diz Rose. Em situações extremas, a construção desse tipo de relação pode ser vital. “Idosos geralmente são pessoas afeitas a hábitos. Se uma senhorinha deixa de sair no mesmo horário para comprar o pão, por exemplo, o porteiro treinado certamente irá até o apartamento dela para verificar se está tudo bem”, reitera. “Não são incomuns os casos em que moradores idosos em situação de perigo são salvos pelos funcionários de seus condomínios”.
Cuidados com o idoso podem proteger o condomínio
De acordo com dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), 17,3% dos idosos apresentam limitações funcionais para realizar as Atividades Instrumentais de Vida Diária (AIVD), que são tarefas como fazer compras, administrar as finanças, tomar remédios, utilizar meios de transporte, usar o telefone e realizar trabalhos domésticos. E essa proporção aumenta para 39,2% entre aqueles acima de 75 anos.
No entanto, Rose ressalta que o processo de envelhecimento é diferente para cada pessoa, por isso a necessidade de criação de um programa específico para essa população. “Do mesmo modo que tem sido comum nos depararmos com pessoas aos setenta, oitenta anos em plena capacidade física e mental, o inverso também é uma constante. Nosso projeto ‘Condomínio Amigo da Pessoa Idosa’ é especialmente estruturado para oferecer aos profissionais que se relacionam no dia a dia com pessoas idosas um panorama atualizado das reais necessidades dos cidadãos longevos”, diz ela. “Seja qual for a situação, o envelhecimento da população brasileira é um fato incontroverso e a sociedade, de modo geral, precisa aprender mais sobre o envelhecimento contemporâneo, para que cada vez mais possamos garantir dignidade a tais cidadãos. Não basta viver mais, é preciso viver bem e com qualidade de vida!”
De acordo com Rose, atitudes simples podem fazer diferença. Ela cita o caso de um senhor com dificuldade de locomoção e que é adepto da leitura dos jornais impressos. Todos os dias, os porteiros do prédio onde ele mora colocam a edição do dia no elevador e enviam ao andar dele. Deste modo, o morador não precisa fazer o esforço de descer para buscar o jornal, algo que seria desgastante para as condições de saúde em que ele se encontra.
O tema não abrange apenas a comodidade e conforto aos moradores de faixa etária mais avançada, mas também o impacto que tal assunto pode causar diretamente ao condomínio, que pode ser imputado por responsabilidade civil, por conta de um acidente, ou até responsabilidade criminal, caso haja algum episódio de discriminação em suas dependências.
Segundo dados do Ministério da Saúde, em 2016 o Brasil apresentava a quinta maior população idosa do mundo, e em 2030, estima-se que o número de idosos ultrapassará o total de crianças entre zero e 14 anos.
“Acho importante frisar que o porteiro, síndico e demais colaboradores dos Condomínios Residenciais precisam se qualificar, e cursos com a proposta apresentada pelo “Condomínio Amigo do Idoso” são de suma importância para que os indivíduos não idosos possam entender de fato as mudanças que o envelhecimento cronológico pode impor aos indivíduos longevos”, afirma Rose. “A empatia a respeito de questões do envelhecimento precisa ser construída, para que todos entendam um pouco mais os desafios que as pessoas idosas enfrentam diariamente”, conclui ela.
Algumas dicas da RD Longevidade para melhorar o relacionamento entre condomínio e frequentadores idosos:
– Oriente funcionários e outros moradores a facilitar pequenas tarefas do dia a dia para o idoso, tais como carregar a sacola de compras ou ajudar a subir e descer escadas.
– Instale rampas de acesso (atentando à Norma ABNT 9050 sobre sua inclinação máxima).
– Instale pisos e carpetes antiderrapantes em pontos estratégicos, como entradas de elevadores ou próximos a escadas.
– Cuide da iluminação. Áreas poucos iluminadas ou com lâmpadas queimadas podem gerar acidentes.
– Sinalize degraus e portas de vidro com faixas de cor visível.
– Instale corrimãos. Eles devem estar em ambos os lados das escadarias, sempre começando e terminando na parede.
– Nas piscinas, substitua as escadas de inox por escadas de alvenaria, desta forma a entrada e saída se torna muito mais segura.
– Elevadores, corredores e passagens devem sempre conter espaço suficiente para possibilitar o fácil manejo de cadeiras de rodas. A dica também vale para a largura de portas (que deve seguir a Norma ABNT 9050).
– Os banheiros de áreas comuns devem ser devidamente adaptados, com barras de apoio e espaço para cadeira de rodas.
– Mantenha com o síndico e na portaria uma lista de contatos de familiares dos idosos residentes no prédio (principalmente aqueles que moram sozinhos), para que possam ser rapidamente acionados em caso de emergência.
– Ainda que não seja obrigatório, tente priorizar as vagas de garagem mais próximas aos elevadores e com maior acessibilidade aos maiores de 60 anos.
Fonte: Jornal do Brasil e Caderno de Niterói – Por Fernanda Lizardo, jornalista.